terça-feira, 29 de julho de 2008

The End !!!

Tudo o que começa acaba, e chegou a hora de o mesmo acontecer a este Blog. Num dos seus livros (Memorial do Convento), Saramago dizia que para fazer voar um determinado engenho era preciso que Blimunda (a heroína) captura-se e junta-se centenas de “vontades”. Eram essas vontades, a que chamo estímulos interiores, que nos levam a fazer as coisas, a lutar e a construir algo; pelo menos é esta a minha filosofia de vida. Ora toda a vida deve ser vivida intensamente mas sempre com “vontade”, pelo menos na maior parte das coisas que fazemos. É com base nesse estímulo, que poderá ter diversas origens, que traçamos o nosso caminho dentro de um conceito de compromisso e respeito. Este compromisso com a vida está implícito em tudo o que fazemos e só nos sentimos bem se o cumprirmos. Para cada período da vida, para cada situação temos diferentes compromissos, honrar o compromisso é o nosso objectivo, mesmo que a outra parte não o cumpra ou, em muitas das vezes que as regras do compromisso mudem. E é aí que as vezes hesitamos e temos de decidir, entre o deixa andar e a mudança. No entanto há sempre factor que deverá acompanhar-nos por toda a vida, que é o respeito por todos aqueles com quem convivemos e com os quais trabalhamos. Quando me refiro a respeito, refiro-me a lealdade, a promover o bem-estar, a camaradagem e a confiança. Por vezes é preciso relembrar que o elemento humano é o factor decisivo para o sucesso de qualquer trabalho, e os indicadores económicos e financeiros são apenas uma consequência directa do desempenho dos seus recursos humanos. É preciso cuidado com a maneira como se lida com as pessoas, em particular com o núcleo duro de qualquer empresa. Actualmente quem não sabe gerir pessoas dificilmente chegará a bom porto. E quando eu me refiro a gerir, não é trocar peças de xadrez, é estimular-lhes “a vontade “ de Saramago. Senão corremos o risco de os perder, e hoje em dia perder bons elementos para a concorrência é perder terreno. No caso presente chegou hora de mudar de compromisso e terminar estas crónicas que ao longo de um ano me entretiveram e foram uma espécie de escape para o mundo, tendo contado com a presença de inúmeros conhecidos e muitos desconhecidos aos quais eu agradeço as suas visitas e opiniões. Que Alah acompanhe aqueles que nele acreditam, quanto outros te não percam a vontade.

Nuno Cordeiro – Ex-tuareg

PS : Já fiz mais tubos que visitantes. A data de hoje 4.385 Tuyaux contra 3334 Visitantes

domingo, 6 de julho de 2008

Allez Allez Portugal

Acabou o euro 2008 e a participação de Portugal. Além de sentirmos uma óbvia desilusão desportiva, sentimos também uma desilusão social. Isto porque o futebol, para além da sua vertente desportiva e da emoção do momento, é o maior veículo de união do povo e também o seu melhor cartão de visita. Um dos aspectos negativos que já referi num dos artigos anteriores é alguma falta de união e de camaradagem que por vezes se sente entre esta pequena comunidade portuguesa perdida no meio dos muçulmanos. No entanto o Euro foi um antídoto para estes males (pelo menos enquanto a nossa selecção estava em prova). Sempre que Portugal jogava, o pessoal reunia-se para umas altas jantares, regadas com muito vinho e cerveja, primeiro de uma forma espontânea, depois de uma forma organizava, na qual já se escolhia o repasto. Ao contrário do que costumava acontecer, o pessoal unia-se tendo a seleção como incentivo e justificação, esta situação tinha reflexos evidentes no dia a dia e em particular nas relações profissionais. Mesmo nos argelinos sentia-se um tratamento mais caloroso de apoio aos portugueses, muitos deles nunca os tínhamos visto, mas eles sabiam quem nós éramos. Afinal a comunidade é pequena mas já muito conhecida na região e posso até dizer bem acolhida. A força social da selecção supera conflito e faz despontar nos portugas o melhor que eles têm : “o gosto pelo convívio”. Biba Portugal, Biba a selecção.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Cadeia da Hamway

Cá estou de volta, caros ciberbloguers, após um longa ausência. Todos os verdadeiros artistas têm um período de retiro para poder encontrar a suprema inspiração. Regresso para vos falar de uma das características comum a todos os países e mais evidente em África: a corrupção. Embora essa “qualidade”, na Argélia, não seja tão evidente porque a forte componente da religião os impede. No entanto, aqui a corrupção é substituída por tráfico de favores, ou melhor, pela cadeia de favores, que geralmente são obtenção de empregos para familiares e conhecidos. A taxa de desemprego, que aqui tem valores elevadíssimos, embora não haja dados oficiais; mais de 50% da população não terá um emprego fixo, vive de expedientes. Assim sendo, quando é necessário resolver alguma situação ou acelerar algum processo, tudo funciona melhor e mais rápido se arranjarmos um emprego para alguém. Muitos dos fiscais, dos diferentes organismos, chateiam até ao dia em que arranjam lugar para um familiar. Estes favores ganham ramificações por si só, pois após a entrada de um familiar vêm os outros, o irmão, o tio, o primo e por aí fora. Muito ao jeito da cadeia da Hamway, um angariado por sua vez angaria outros, quando damos por ela já toda a família trabalha na empresa. Dado que os salários são baixos, por vezes compensa fazer um destes favores para se resolver rapidamente um problema. Tal como aí, em Portugal, o maior empregador do país é o estado, mas com a cadeia de favores a funcionar, normalmente, existe mais do triplo de pessoas que as necessárias, reparem quantos pessoas são necessárias para reparar um posto transformador. É nestes casos que o provérbio “ A união faz a força “ é bem empregue, pois quantos mais estiverem a olhar, mais força há para se fazer o trabalho.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Royah Royah

Um país define-se pelo seu povo e pelos seus hábitos e a Argélia não foge à regra; para além dos seus estranhos costumes, os argelinos no seu geral até tentam ser simpáticos com os portugas e as histórias seguintes são prova disso. Há cerca de duas semanas, um colega nosso regressava a casa pela auto-estrada quando teve um furo e foi obrigado a encostar à berma. Ainda estava ele especado a olhar para o pneu furado e a rogar pragas à vida, quando encosta uma pick up logo atrás do carro e da qual saem 6 gandulos e se dirigem para ele. A sua primeira reacção foi de pânico e medo, no entanto, a vida é cheia de surpresas, os tais 6 gandulos começaram a dizer “Royah, Royah”, (Irmão, Irmão), Onde está o macaco ? Onde está a roda suplente ? Ainda meio zonzo, o portuga lá disse onde estava o material e, em menos de 3 minutos, o pneu estava trocado, o outro arrumado e os 6 gandulos meteram-se a pick up, disseram mais um “Royah, Royah” e partiram sem querem algum dinheiro de agradecimento que o portuga lhes tentou dar. Noutro lado da cidade, alguns há que se aventuram pelos mercados locais; estes são, normalmente, grandes, desorganizados, muito concorridos e decorrem em zonas mais antigas das povoações cidades ou não, pelo que a orientação é difícil. Dado o elevado número de “clientes” destes mercados, torna-se absolutamente impossível evitar todo o tipo de contactos físicos (para alguns estes seriam absolutos paraísos) e estes são passeios pelos mais díspares estímulos olfactivos – odores corporais com semanas, bancadas com todas as especiarias e mais uma, o sempre “fiel” cordeiro (e não sou eu) também por lá anda no ar, peixe de um dia ou do outro – enfim, uma paleta cheia …Um de entre esses, um portuga já calejado com estes ambientes, ia subindo a rua, cauteloso, mantendo a mão sempre no bolso onde tinha carteira e documentos, quando sentiu que tinha as calças molhadas (por segundos pensou : - Estranho regresso à infância!!) mas logo foi interrompido por um solícito “royah” que lhe falava em árabe enquanto prestavelmente lhe sacudia as calças onde alguém lhe entornara água … simpático, este argelino! pensou ! Ainda atordoado pelo sucedido, apercebe-se, de repente, que além de lhe ter sacudido as calças molhadas na perna esquerda, o simpático argelino lhe havia “sacudido”, também, a carteira que tinha no bolso da perna esquerda … simpático, este argelino! pensou! Mas mais surpreso ficou quando alguns minutos depois, e quando, praguejando, se dirigia para uma eventual saída, lhe tocam no ombro e quando se volta vê, à frente dos seus olhos, a sua carteira … a qual pegou de imediato, tendo o seu portador desaparecido na multidão, simpático, este argelino! pensou! Apesar do dinheiro ter se sumido, todos os outros documentos estavam lá, isto é o que poderíamos chamar um serviço limpinho……

Redoah Inchalá

sábado, 19 de abril de 2008

A Feira – Parte I

Após algum período de interregno (afinal todos os artistas tem deter um tempo de reflexão) eis me de volta as crónicas deste país a beira-mar plantado. Hoje com uma crónica sobre uma das feiras mais importantes da região que se realiza todas a Sextas-feiras, a FIM – Feira Internacional de Mesra. Trata-se de uma feira muito ao jeito da FIC – Feira Internacional de Carcavelos, mas nos seus bons velhos tempos onde a mesma se expandia por todo o lado e reinava a confusão, ao contrário de agora que é tudo muito organizado e restrito. Esta feira de Mesra vende quase de tudo desde pneus, bugigangas, comida, animais vivos ou mortos entre muitas outras coisas. Ao contrário da FIC, na FIM a presença de mulheres é muito rara talvez porque aqui não se vende nem roupinha de marca, nem lingerie. O caso dos animais em particular dos carneiros, é especial, pois o cliente pode comprar o bicho que é morto no chão enlameado, estripado e pendurado a nossa frente, o que lhe confere o tal gostinho especial (Ver foto). Os comes e bebes não podem faltar com a higiene que já é uma imagem de marca deste país. Havia inclusive uma que até tinha um serviço de self-service (Ver foto). O cliente servia-se do pão bem junto ao chão, cortava e colocava no seu interior os diferentes ingredientes a sua escolha e no fim o homem da caixa servia-lhe um copito de sumo retirado bidão de 200 lts com um pequeno recipiente plástico que já demonstrava ter sido usado milhares de vezes sem nunca ter sido lavado. Escusado será dizer que nenhum de nós quis saborear este delicioso repasto, o que é uma prova inequívoca que a integração ainda não está completa, ainda temos muitos preconceitos de higiene a abolir.

Redoah Inxalá

sábado, 22 de março de 2008

Em busca do Graal

Muitos de nós partimos para longe, para os lugares mais estranhos movidos pela a esperança de construirmos uma vida melhor. É certo que no caso de um país muçulmano, como Argélia, com alguns riscos associados, a mudança é mais difícil, os nossos hábitos tem de ser limitados e readaptados a realidade do país, mas isto são só o que poderíamos chamar os custos directos. Mas qual os custos indirectos a pagar por essa mudança ? Cada caso é um caso, tudo depende da nossa situação anterior, tanto pessoal como profissional. Se pretendemos recomeçar uma nova vida, se estamos numa situação difícil, se não deixamos família para trás então o preço é razoável e a mudança quase que se impõe. No limite, se as coisas não correrem bem, ficamos com uma nova experiência. No entanto se tivermos uma vida estabilizada, a mudança pode ter um preço alto, chegando muitas vezes ao desmembramento da própria família. Uma coisa é certa muitos dos momentos que deveríamos e gostaríamos de estar presentes, não estamos. O resultado final só pode ser visto alguns meses depois do regresso, pois as marcas do afastamento só se vêm muitas vezes após o mesmo. E para quê? Muitos pelo aspecto financeiro a curto prazo, outros por um reconhecimento que os projecte dentro da organização. No entanto nem sempre as apostas são ganhas, por vezes o esforço parece inglório, e o resultado resume a uma experiência que apesar profissionalmente poder ter corrido bem revela-se pouco para o esforço, muitas vezes elevado (directo e em particular indirecto), dispendido. Mas sempre devemo-nos guiar por um princípio no qual mais vale nos arrependermos por termos feito, do que nos arrependermos de nunca o fazer. Estas experiências também servem muitas vezes para nos mostrar que provavelmente estamos no sítio errado e que devemos procurar novos caminhos, às vezes uma mudança impõe uma nova até chegarmos a bom porto. Koun saïdan (Be happy)

Redoa, inchala

domingo, 16 de março de 2008

All the way to Meca

A peregrinação anual a Meca, denominada Hajj, constitui um dos cinco pilares do Islão, sendo o destino final da viagem Caaba, a Casa de Deus, um edifício quadadro de pedra negra, coberto por um tecido negro, onde tem de dar sete voltas no sentido contrário aos ponteiros do relógio. Qualquer Muçulmano de saúde e com posses para isso tem o dever de fazer essa peregrinação, pelo menos uma vez na vida. Os peregrinos devem entrar num estado de uma pureza ritual; para tal além de terem de tomar banho, tem de ir ao barbeiro e à pedicura, vestindo uma fatiota a rigor denominada ihram, o tal lençol que cobre o corpo todo. Na altura da viagem, que se realiza no último mês lunar, o povo aqui do sítio invade os aeroportos para entrar no avião rumo à terra prometida, invadindo também as casa de banho dos mesmos para lavar os pezinhos nos lavatórios. A maior parte leva apenas uma sacola e nem tem, nem sabe onde ficar no destino, é tipo um interrail para a terceira idade. Isto porque esta viagem é normalmente realizada por pessoas com mais de 60 anos por duas razões. Primeiro por uma razão económica, tem de se fazer um pé-de-meia para pagar a viagem e, segundo, porque a partir desta viagem o pessoal não pode pecar mais senão a viagem perde o sentido. Ou seja, após a ida a Meca, a malta não pode beber uma cervejola, comer uns enchidos, galar umas mulas e ainda tem de cumprir com todas as obrigações religiosas como as orações, o jejum do Ramadão e dar a esmola (zakat) voluntária por caridade. Agora já estão a perceber porque é que o pessoal só quer ir a Meca lá mais para o final da vida, assim não custa tanto.

Redoah, inxála